Trauma

Não sei você, mas eu conheço todos os latidos do meu cachorro. Sei quando é gente passando na rua, quando é fome, quando é sede, quando é manha, quando é o carteiro... Aliás, latido para carteiro aqui em casa é sempre sucedido de um ataque à caixa de correio – de metal – que mais parece uma lata aberta de tão retorcida que ficou ao longo de anos e anos de mordidas. Não a troco porque sei que o dog ficaria deprimido. Porém, o latido dessa vez era diferente. Mais baixo, como se ele não quisesse ser ouvido. Estranho. Quando ele não quer ser ouvido, porque vai fazer alguma cagada, ele não late. Meu cachorro baba muito, afinal, é um boxer. Baba e tenta dar patada nos outros. Já o levei a um psicólogo para resolver tal surto, mas ele não falou muito durante a consulta (o cachorro) então desisti. Aproximei-me e vi qual era a bronca: uma abelha. Ele tentava mastigar uma abelha, que lutava pela sobrevivência. Infelizmente, não era a primeira vez que isso acontecia. Ele tem problemas com abelhas. Deve ser algum complexo de infância, sei lá. Se fosse apostar, diria que sofreu bullying, mas não sou especialista para fazer tal afirmação. Parecia uma batalha épica, o elefante e o rato. Chamei meu irmão que, por conseguinte chamou minha mãe que em seguida chamou meu pai que já estava querendo ligar para a vovó... Começaram as apostas. Coloquei cinqüenta centavos no Bull, e todos foram a favor do inseto. Depois de passados quinze minutos de guerra fria, a abelha já havia se recomposto, senti que era o momento decisivo da batalha. O movimento da pata esquerda indicou um ataque frontal, imagine em slow motion, o movimento de recuo estratégico da abelha seguido de um latido seco e intimidador, patas para cima mais um latido e uma mordida fatal.  A última coisa que ouvi foi um gemido triste e dolorido... E lá se vão meus centavos.

Jeremias Apolinário Junior

                                                                                Letra - Turma A

Imagem: Travis Dewitz
Música: Pink Floyd - Seamus